Sunday, May 6, 2007

"eu abro a dor de ser quem sou. de tudo amar."

· stop.
o céu é feito de pássaros azuis.










passo por um gato que é feito de manchas pretas e brancas; aguarela que os meus olhos se acostumaram a ver. os meus olhos que são feitos de lágrimas com uma íris negra que projecta o fim numa parede branca.
são 20.00. está demasiado frio. o meu pai não me vem buscar e aquela miúda parece-me muito mais do que alguma vez fui com a idade dela. um tipo com quem me enrolei duas vezes passa por mim e sorri-me. não sou capaz de mover uma palha. acreditas que já vejo a lua?
imagino o rapaz-pastilha-elástica-azul-colada-na-estrada e nas melodias tristes em cima da cama. todas as cartas que escrevemos um ao outro sem nos vermos. toda a gente que espera uma carta minha há meses e a minha incapacidade de ter uma conversa normal em que não me apeteça mandar toda a gente pó caralho.
os meus amigos são o que são e eu gosto deles assim. encosto a cara ao poste frio enquanto me lembro de passar pela padaria com a luz vermelha. sentir-me a puta à procura de pão quente. ficar de mãos vazias. senhores, alimento-me de tabaco. e já não é cravado. é bom ser-se um filho-da-puta igual a toda a gente com algum dinheiro na conta. E não quero mais cor que essa. Só a do vestido que vou comprar para dançar em cima da tua campa.
Encosto a cara fria à lua gelada. Senhores, aquilo são folhas? o meu pai não me foi buscar e eu espero o autocarro ao frio. pai que só não me pariu porque não quis. porque nem valia a pena. ele sim. tem as suas conversas privadas com Deus à janela e diz a toda a gente que não acredita Nele. nEle.
Olhos nos olhos e nunca o olhar de lado. sim. olho sempre de frente para o que não quero ver. Meu amor, quantas vezes me perdi por pensar que os teus olhos eram iguais? Privei-me aos outros desde há uns tempos para cá. é estupidamente verdadeiro e imbecil para se ser dito. Mas sim é verdade como as vezes que já matei a minha mãe. Daqui a uns meses há um abraço e voltamos ao mesmo de sempre. tenho vontade de vomitar.
vou deixar de comer carne de porco. é a única que deixei de suportar.
afinal o meu pai sempre me vem buscar. a conversa é banal e eu como cigarros até casa. sempre ocupei esse banco e nunca o lugar do condutor. sempre me atrevi a pôr o tronco de fora da janela e gritar enquanto toda a gente me agarrava e eu tocava com os dedos no asfalto. nada disto é real. se era quando tinha 18 anos deixou de ser, que para mim já não há essa coisa das idades.
já não há essa coisa dos nomes.
a lua estende-me a mão e faz-me uma festa na cara. eu agarro-a e olho-a de frente com os olhos cheios de lágrimas e queimo-me. fecho os olhos e vou directamente a voar para casa, mesmo quando o meu pai pára para comprar ovos que eu não como. nem quero comer. odeio ovos. odeio a luz. a lua. o barulho contra os ouvidos. E é o mar a entrar-me pela casa e a dançar em mim como um sorriso que já não tenho. fecho a boca com as duas mãos e tento não chorar até dormir. durmo e acordo a chorar.
senhores aquilo são folhas brancas?
o caminho de casa.
não acaba.
O meu pai pousa-me a mão no ombro. diz "chegámos" como acontecia quando tinha cinco anos e eu fingia que estava dormir no carro só pelo prazer de ser levada ao colo. mal falo à minha mãe. entro para o exterior, através da janela aqui ao lado. sento-me nas telhas.
e olho de frente. para ti. para o sonho que nunca morre do outro lado sem me matar mais um bocadinho cada vez que acordo.

[algures em janeiro para um espelho que não existe.]






(passado uns meses tudo é diferente. apetecia-me mais ter escrito a "Nuvem" que o manel escreveu tão bem, mas claro está... ele há-de ser sempre exacto no que diz. sou grande apreciadora disso. apreciadora.)

4 comments:

Anonymous said...

os pássaros azuis sao coisas q me fazem sorrir.

Rita said...

*

ainda te lembras de mim?

Klatuu o embuçado said...

Como eu gostava de ser uma lolita na minha próxima encarnação! :)=

Dark kiss.

Anonymous said...

visitar o teu blog é uma montanha russa de emoções. Ler o que escreves é... é.

(Confusão de sentimentos, cores e odores – antes dentro de mim. O Agora funde-se com o Antes, tão hábil e violentamente, em tons violeta. Apaziguador.
Tento ressuscitar reminiscências esquecidas, apagadas, levadas ao fundo por ti. O efeito é desatinado, a ânsia come de novo, o desejo asfixia… Peço-te que as guardes de novo, quando o ar me falta. Não me ouves, não estás, e o desejo vai permanecendo. Asfixiante.
Quando, já branca, tento gritar o teu nome, um nó na garganta fá-la gritar, morrendo, e caio, apagada no asfalto…

* )